segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Êxito

Pragmática, ela caminha entre as fileiras de funcionárias de sua pequena confecção. Desde bem pequena, o som das máquinas de costura enche seus ouvidos. No ínicio, era como um despertador. A mãe - costureira - acordava antes dela, e já começava, bem cedo, seus aviamentos. Aos poucos, à medida que crescia, via aumentar dentro de si o desejo de compartilhar aquele ofício com sua mãe.

Ela trabalhava tanto que nunca tinha tempo para a filha - a aproximação através do trabalho pareceu-lhe óbvia desde seus seis anos. Começou anotando em um caderninho as medidas das clientes regulares de sua mãe. Assim, logo que aprendeu a ler, mostrou sua serventia. Dali para a máquina, um pulo. Para o corte, pulo e meio. E assim, quase sem perceber, aprendeu o ofício - e descobriu seu talento. Era uma modelista. Desenhava vestidos tão lindos que a quantidade de trabalho quase triplicou, e, quando fez quinze anos, uma cliente importante, mulher de sociedade, fez a sua mãe uma proposta:

- Eu gostaria de te oferecer uma oportunidade à Esmeralda, Arlete. Você é melhor costureira que já conheci, e não visto nada que não seja grife se não for realizado por você. Mas essa menina sua é um achado! Ela é estilista do berço. E eu acredito no potencial dela.
- E o que a senhora tem em mente, dona Escolástica?
- A idéia é mandá-la para uma escola de estilo. Sei que ela vai despontar.
- E o que a senhora ganha com isso? - perguntou a mãe, desconfiada como boa mineira.
- Ganho o direito de agenciá-la como estilista, e de comercializar o trabalho dela, por um período de cinco anos.

A mãe ficou de conversar com a filha. Sabia que era uma oportunidade de ouro - mas era Esmeralda que decidiria.

E agora, todos aqueles anos de estudo, de trabalho árduo e muita dedicação estavam se pagando. Agora, é a sua própria confecção. Seu trabalho rende dividendos só para si. Dona Escolástica tinha sido uma fada madrinha - só que agora, a Cinderela não precisava mais de príncipe encantado - ela sabia cuidar de si.

Dona Arlete, a mãe, não vivera para vê-la formada. A artrite que lhe incomodara desde sempre transformou-se num câncer ósseo. E quando descoberto, já era terminal. Ela ficou sozinha. Sua companheira de vida era a mãe. Era dela que sempre sentiria saudade.

E por isso decidira não formar vínculos, caminhar sozinha nesse mundo, celebrizada em seu trabalho, mas nunca em sua vida pessoal. Não haveria filhos, ou marido. Talvez amantes - homens e mulheres - mas ninguém a quem se apegar.

Um dia, quem sabe, viria a baixo - aquele palacete, aquela construção elaborada que era ela. Um dia desses, alguém dirá, ela cairá do cavalo.

Por hora, seu pragmatismo a leva adiante, um pé de cada vez. No ritmo da cerzidura.

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