quinta-feira, 30 de julho de 2009

Olinda

Sentindo o perfume da cidade entrar pela janela entreaberta, ela se preparava para os mistérios que desbravaria no novo dia. Era a terceira manhã, e seu coração já havia decidido o destino, muito embora ela não tivesse consultado suas companheiras de viagem. Sentia que precisava fazer aquele passeio sozinha. Suas amigas só conseguiam pensar em curtir a badalação da cidade, ver os points da galera, pegar uma praiana. Tudo o que faziam em casa. Ela era diferente. Seu pensamento estava sempre no novo, em o que havia de belo e sujo, de dissonante e contraditório, de peculiar e delicado, em cada um dos lugares que visitava.

Daquela vez não seria diferente. Ou seria? Ela sentiu uma inquietação interna, quase uma pulsão - do momento em que seus pés tocaram o chão daquela cidade. Sentia-se atraída por aquele lugar. Como poucas vezes antes. Como nunca - agora que pensava nisso.

As meninas acordaram já de canga e protetor na mão. Ela fez cara de cólica. Era batata. Ninguém força barra - nem torra o saco. Ela teria o dia livre para curtir seu programa, e estaria de volta antes delas - disso não tinha dúvidas. "Ratas de praia como são... Vou, volto, e elas ainda nem pensaram em sair de lá..." Desta vez não podia estar mais enganada.

Deu um tempo até que as meninas tomassem o caminho da areia. Só então levantou-se e tomou um banho. Um café da manhã reforçado seria um bom começo. Afinal, ela teria que andar muito naquela cidade - e ela quase podia ouvir a mãe dizendo "Come, menina! Saco vazio não pára de pé..." A dona da pousada até estranhou:

"Ôxi, ficou prá trás, é? Visse isso, Arnaldo? Essa menina tá desgarrada..." E os dois riram muito - com ela.

"É que eu estou meio indisposta... Prá praia, pelo menos. O que mais se faz por aqui?"

"Como assim, menina?" A dona Maria era aquele tipo de pessoa que te olha e te enxerga de verdade. "Você deu um baile nas Cajazeiras, é? Que espertinha, visse Arnaldo?" Seu Arnaldo nunca abria a boca, só acenava um acordo - e parecia automático. Talvez fosse a melhor maneira de conviver com uma fêmea dominante... Ela riu daquele pensamento, e, como não continuassem a prosa, concentrou-se na tapioca de côco e queijo. Foi alçada de suas divagações por um toque suave:

"A menina espera mais do passeio, né isso?" Era Seu Arnaldo. Seu Arnaldo! Ignorando seu olhar de surpresa incrédula, ele prosseguiu:

"Vá passear à pé na cidade, vá olhar os cantinhos, visse? Lá donde viesse tem praia, né não? Então... Pegue um ônibus, se misture co'as pessoas daqui, pergunte onde pega ônibus prá Olinda... Vá olhar Olinda de perto... É lá que bate o coração de Pernambuco... Lá é a terra do Maracatu..." O seu olhar ficou perdido. Ele estava falando com o coração. Seus olhos marejados calaram qualquer comentário jocoso. Ouví-lo dizer só confirmava o que seu coração adivinhou. Ela sentiu que era aquilo que ela viera fazer ali. Sentir daquele maneira. Encontrar algo perdido - que nunca tivera, mas era seu. Agradeceu comovida:

"Obrigada, seu Arnaldo. Eu vou fazer tudo isso. Vou sim."

"Eu sabia que você era diferente das outras, visse, bichinha..." Eu sorriu. "E é Naldo. Prá você, só Naldo, minha filha." Ela sorriu e deu um abraço no homem - não pode conter-se. Ele era como um tio, um tio avô - pela idade. E lhe queria bem. Ele devolveu o sorriso e lhe acenou a saída dos fundos - sem palavras - enxugando as lágrimas na fralda da camisa.

Sem perder tempo, ganhou a rua. Estava livre pela primeira vez desde a chegada, e aquele dia era dela! Não demorou muito para chegar até o ponto de ônibus, e logo descobriu que devia pegar o Rio Doce. Os dez minutos de espera se arrastaram, ela estava ansiosa, e não sabia porquê.

Quando a condução chegou, ela pulou prá dentro sem cerimônia. Foi até maleducada, afinal podia ter dado a vez paras as velhinhas. Ms não pode conter-se - tampouco desculpar-se. Teve tempo para olhar a sua volta, enquanto o ônibus dava voltas pela cidade. Era uma linha movimentada, e passava pela periferia antes de tomar o rumo da cidade vizinha. Ela estava hospedada num hotel três estrelas, no bairro mais badalado da cidade. E agora transitava por ruas totalmente diferentes, onde ela via a cara do povo recifense de verdade, onde ela se confrontava com a realidade e as contradições de uma cidade tão diferente e tão igual à sua. Teve certeza de que estava fazendo a coisa certa. O que ela queria era entender a alma daquele lugar, não contemplar sua fachada "para inglês ver".

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Sobre livros... e love

Acordou com gosto de sangue na boca. Ao seu lado, um homem que não conhecia. As paredes a sua volta, e os lençóis que envolviam seu corpo... Nada ali era familiar. No entanto, o que acontecera ali não tinha sido banal. Trivial. Não.

Especial. Sublime. "Isso. Sublime." Ela sabia que amava aquele homem, e nem sabia quem ele era! O sangue em sua boca era dele. Nos lábios dele, um corte feito por dentes - os dela. Ele havia permitido aquela loucura. E talvez por não ter parecido a seus olhos insanidade. Talvez ele não soubesse o que aquilo significava para ela - o sangue. "É o maior presente, é a vida! Por todos os deuses, como alguém pode não saber o que o sangue significa?"

Olhando a sua volta mais uma vez... Vestígios de sexo por todos os cantos. Lembrou-se vagamente de pulsos atados, e olhos vendados. Sentiu o gosto da saliva e da semente daquele homem no fundo da garganta, como uma lembrança inquieta. Fechou os olhos para rememorá-lo melhor. E depois os entreabriu, e fixou seu olhar naquele homem. Ela nunca mais o veria. Mas ele entregou-se a ela como poucos. E a tocou como poucos - seu corpo, sim. Mas principalmente sua alma. Ela sabia ter aberto um espaço mínimo - quase uma fresta - todas as vezes que se deitara com um homem. Esse fora o terceiro capaz de tatear essa fresta e penetrá-la com os dedos da alma, tocá-la com mais que pele e suor, desejo e fúria - com paixão.

Ela sabia daquela paixão como que por instinto. Ele dissera, em algum momento da noite. Mas não foram suas palavras que lhe comunicaram a verdade daquela afirmação. Ela sentia dentro de si, num lugar íntimo e úmido do peito. Ele estava apaixonado por ela. Ela era a própria paixão. E raramente permitira-se apaixonar, como então. Sentia-se atraiçoada agora. "Ele encontrou a fresta. E agora vai embora, maldito. Vai retirar-se de mim como os dois outros antes dele. Era eu que devia me retirar desse jogo perigoso. Para sempre! Fechar a maldita fresta de uma vez. Nunca mais amar, nunca mais sentir..." Imediatamente um arrepio percorreu-lhe todo o corpo. Isso seria pior que a morte. Preferia sentir intensamente, para perder. Mas sentir. E ela não podia saber se ele iria retirar-se. Não com certeza. Mas tinha a intuição...

Ele tinha família, e ela sabia disso. Talvez pensasse que era melhor não estar mais com ela, para não fazer sofrer a esposa, as filhas... Ela não estava interessada naquilo. Ela queria somente sentir a verdade da paixão que ele proclamara, mas não sustentaria, agora que o dia raiava e seu vôo partiria em três horas. Quando ele partisse, agora que a paixão se fizera carne, suas emoções se retirariam do cenário. Aquele cenário de luxúria e apego, de carne e sangue, do encontro de almas. Era um quarto de hotel. Nada mais óbvio. Nada mais comum. Incomuns eram os dois... E ela ficaria ali, sentada no meio das cinzas do que acontera. Ali. Littered...

Sentia-se um lixo. E as lágrimas que reprimira por todo o tempo desde o despertar começavam a rolar por suas faces, e os olhos náufragos, sem esperanças. Ele estava acordando, agora. Ela não queria que ele a visse chorar.

- Bom dia, meu amor. - Tanta verdade naquelas palavras... Ela replicou:
- Sim, meu amor, bom dia. E que lindo dia para voar, não é mesmo?
- Se pudesse ficaria mais um dia ou dois, mas é que... Ela o interrompeu, os dedos sobre seus lábios.
- Isso é problema seu, meu amor. Não traga isso para cá. Esse lugar não é exatamente um confessionário...
- Ok. Se você prefere assim... Eu devo voltar a São Paulo semana que vem. Você me encontra?
- Claro. - Aquele pedido era como luz no meio das trevas. Ela estava disposta a mendigar para se sentir desejada daquela forma novamente.

Ele foi tomar banho. A promessa de um novo encontro deixou-a mais animada. Ela sentiu que talvez esse homem pudesse entender que ela não queria nada além da certeza de ser desejada, amada, alvo da paixão de alguém. Ela precisava disso, e disso somente. Era o que a faria sentir viva de verdade. Aquelas horas entre o anoitecer e a alvorada, quando suas vidas reais ficariam em standby, e eles estariam nos braços um do outro novamente. "Dane-se o resto" - ela pensou, enquanto observava seu ritual de vestir-se. Ela já estava pronta há horas.

Desceram juntos até a recepção. Ele pediu dois taxis. "Leve a moça onde ela quiser ir", ele disse ao motorista do taxi onde ela estava. "A cooperativa vai cobrar no meu cartão de crédito."

- Você me liga quando chegar em casa? Ele perguntou, sorrindo.
- E você, me liga quando chegar na sua? Ela retribuiu o sorriso.
- Claro. Não quero que se preocupe.
- E quem disse que eu vou?
Os dois riram muito. E beijaram-se pela janela do taxi. A um seu sinal, o motorista arrancou.

- Esse homem gosta da senhorita... Bem, para onde vamos?
- Cidade universitária.

O trajeto correu tranquilo. A cidade mal tinha acordado e as ruas ainda estavam pouco movimentadas. Quando chegaram diante do prédio da biblioteca, ela pediu:

- Pode parar aqui mesmo, obrigada. - Deu ao homem dez reais de gorjeta. - Um bom dia para o senhor, e uma boa semana de trabalho.
- Igualmente, senhorita.

O homem foi embora pensando que nunca tinha visto uma mulher tão linda - nem tão triste. Devia ser mesmo muito triste amar um homem que vivia em outra cidade. E devia ser muito triste para ele também ter que dar as costas a uma deusa como aquela. Se fosse com ele, ia querer voltar para ela todos os dias: encontrá-la, amá-la e dormir aconchegado em seus braços. Aquele era um homem de sorte...

Ela observara o taxi afastar-se e só então voltara-se para subir os degraus da biblioteca. Enquanto olhava o taxi, mentalizou uma semana inteira de muitas corridas curtas - que são as mais lucrativas - e algumas longas, com clientes interessantes, que se tornariam regulares. Ela não costumava presentear as pessoas assim, tão graciosamente, mas intuiu o carinho que o homem sentira por sua situação - e resolveu retribuir, porque tinha poder para isso.

Desfilou por entre os corredores da biblioteca, arrumou algumas prateleiras, limpou a lombada de dois ou três livros queridos. Estava chegando a seu destino.

Naquela última mesa do último corredor, aberto ainda na mesma página, estava o seu livro. Sorriu para ele. Da página da direita, sorria-lhe de volta um fauno:

- E então? Encontrou dessa vez?
- Ah, meu querido, e como encontrei...

Os dois riram muito. Agora era hora de voltar para casa. Seus dedos deslizaram pela mesa até o contorno da página aberta. Ao toque sutil de seus dedos, a página a recebeu de volta. Com um bruxuleio suave de luz amberina, ela voltou para dentro do livro.

- Bem vinda de volta, Musa!



quarta-feira, 8 de julho de 2009

Negro - parte dois

Tantos anos ele havia resistido. Lutara - não contra o sentimento - mas para não revelá-lo a ela. E agora suas muralhas ruíram, e ele não pôde mais se conter. Enquanto dizia, de seus olhos corriam lágrimas. "Agora ela vai me humilhar, vai brigar comigo, vai gritar e perguntar por que eu nunca contei aquilo antes" - ele pensou, enquanto, em seus braços, a mulher mais importante da sua vida se virava, incrédula, para olhar para ele.
- Você disse isso mesmo?
- Disse Ana. Disse sim.
- Por quê?
- Porque eu precisava dizê-lo. Porque hoje é um dia tão bom quanto qualquer outro, porque é verdade, sempre foi. E porque eu não sei se você vai querer me ver de novo... Eu te amo, Ana. Sempre te amei.

Disse isso olhando em seus olhos, dessa vez. E ela ouviu, pela segunda vez em menos de dois minutos, o que desejara ouvir toda uma vida. Não conseguia atinar, faltava-lhe ar e ela não sabia se aquilo estava mesmo acontecendo. Toda a sua vida construída, todas as escolhas que fez, as fez depois de excluída aquela possibilidade. Ela pensava que jamais haveria outra chance com ele. E chorou muitas noites em silêncio, seus gritos presos na garganta, o rosto enterrado fundo no travesseiro encharcado de lágrimas - muitas lágrimas. Ele era o homem que queria. Ele negou-se a ela toda a vida. E oferecia agora o que ela sempre quis, mas não poderia ter agora. Sua vida tinha outras prioridades. Sua família dependia dela, seus filhos eram sua responsabilidade full time - o marido era diretor de uma multinacional, da divisão da América Latina, e viajava constantemente. Ela era o sol de seu pequeno sistema planetário. E eles precisavam de sua gravidade para se manterem no espaço. Como ele podia fazer aquilo? O que ele esperava que ela fizesse com aquela informação?
- Eu não sei o que dizer, Leo...
- Você não precisa dizer nada, Ana. Você sempre disse. Sempre deixou claro, nunca dissimulou nada, nunca se escondeu atrás de desculpas para se manter livre e continuar aproveitando sua vida... Se eu tivesse sido homem, tinha casado com você quando fui transferido para a Turquia. Teria te levado. Minha. Minha mulher. Hoje, tudo é diferente...
- É... Tudo é diferente - ela disse baixinho, como para ela mesma. Mas a paixão era a mesma, dentro dela a mesma chama castigava seu coração. Estava para sempre presa naquela armadilha. Nunca o recusaria. Só que agora era diferente: ela não poderia ser dele. Nunca. Por motivos escolhidos por ela, eleitos para a sua vida quando ele a deixou.

Seu silêncio era uma surpresa para ele. Esperava que ela tivesse explodido em palavras, que o tivesse xingado e torturado com sua retórica. Mas ela calara. Ele olhou para ela e viu o motivo - ela nunca gostou de se ouvir falar chorando.
- Você me ofereceu uma coisa que eu sempre quis, mas agora não posso ter, não posso querer, Leo. Eu tenho a vida que escolhi. Eu sou mulher de um homem, e mãe de seus filhos, dona de uma casa linda, gerencio os negócios do meu pai... Eu tenho uma vida, Leo! Eu tenho compromissos, e não quero nem vou abrir mão deles!
- Nem eu quero que você faça isso. Me perdoe por tê-lo dito. Se eu soubesse que você ia se sentir mal por isso, jamais teria dito. Parece que eu fui feito para te fazer chorar.

Ainda assim, se olharam. Não era nada disso, nem daquilo. Um não tinha expectativas com relação ao outro. E no entanto, não deixavam de se querer. E desejavam - os dois - que houvesse um mundo paralelo onde pudessem viver aquele sentimento. Abraçaram-se longamente. Dentro de cada um, tantas perguntas e nenhuma resposta. E seus lábios se fecharam num beijo molhado de lágrimas. Era instantâneo, e irresistível. O desejo indissociável do amor, o desejo que sempre se pronunciara, a única coisa que sempre fora clara em eles. Jamais seriam indiferentes um ao outro.

Tocaram-se novamente. E sabiam que dessa vez seria totalmente diferente de todas as outras: finalmente sexo e amor, uma coisa só. Seus corpos se uniram como antes, como de outras vezes; a cada vez que seus olhos se encontravam, ficavam fixos um no outro. Nunca tinham se amado daquela maneira, como se olhar para o outro fosse mais erótico que o próprio sexo. Estavam descobrindo que os olhos eram as zonas erógenas da alma. E suas almas se amaram como nunca. Dessa vez - pela primeira vez - ele estava desarmado. Conquistado. E nunca sentira tanta plenitude.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Negro

Sua pele negra como a noite era o que mais perturbava seus pensamentos. Desde a muito, desde sempre. Apareceu de novo por acaso. Já fazia cinco anos que não se viam. Ele tinha se mudado para Istambul, a trabalho. Conseguiu seu telefone novo. E ligou.

- Bom dia, posso falar com a Ana?
- É ela.
- Olá querida! Você sabe com quem está falando? - seu coração adivinhou antes que sua mente atinasse.
- Não... Peraí. Leonardo?
- Querida, você lembrou! Quanto tempo. Que saudade...
- Nossa, Leo, como você me encontrou?
- Achei seu telefone - Era mentira. Ela estava casada há três anos. Aquele telefone não existia quando ele viajou.
- Que bom! Que novidades você me conta?

E a conversa se estendeu por uma hora. Ela estava casada, tinha dois filhos - casou-se com trinta, não quis perder tempo. Ele não tinha filhos, mas também estava casado. Aquela informação foi um balde de água fria. E ela relaxou. Ai a conversa fluiu. Ela imaginou que enfim poderiam ser amigos. Durante os dez anos em que mantiveram contato, nunca foram nada - mas foram tudo um para o outro. Eram amigos, amantes, namorados, confidentes. Conversavam sem trocar palavras. E agora, de repente, o encontro telefônico trouxe à tona sentimentos a muito esquecidos. Ela se pegou várias vezes pensando se não seria melhor que ele não a tivesse procurado. Ela não precisava dessa distração. Não agora.

Ela vivia bem com o marido. Mas ele estava sempre viajando. E ela sentia falta de sexo. E aquele homem era sexo bom garantido. Por outro lado, pensou que depois de tantos anos, ela mais velha, o viço da juventude dando lugar inexoravelmente à maturidade... Por que aquele homem, aquele deus de ébano, iria quer alguma coisa dela que não a amizade?

Ficou no ar um almoço, dia desses. E ela pensou que ele esqueceria. Mas não esqueceu.
- Alô.
- Oi, minha linda... Um sorriso na sua voz, e uma sensação leve na cabeça dela.
- Oi, Leo. O que você manda?
- Não mando nada, só peço. Quando você pode almoçar comigo?
- Amanhã eu só trabalho pela manhã. Pode ser?
- Com certeza. Te pego no teu trabalho meio dia.
- Combinado.
- Um beijo bem gostoso para você...
- Outro, querido.

As pernas moles. "Meu Deus, o que está acontecendo comigo?" Ela perguntou, mas sabia a resposta. Marcelo estava em Aracaju há dez dias, e só voltava na semana seguinte. "Isso vai ser difícil..."

E ela mal conseguia comer. Desde o telefonema ela não pensava em mais nada. E ele a tinha convidado para um almoço. Seria um vexame não comer nada num almoço.
- Olá, linda!
- Oi, querido...
- E então, o que você quer comer?
- Ah, não sei. Tenho estado meio sem fome... Sei lá, muito trabalho, as crianças e a casa... - tantas explicações. "Para que você está se explicando, criatura?"
- Sem problema. Então a gente dá uma volta, conversa, bota a vida em dia. Que tal?

Ele lá tão confiante, e ela um caco, toda insegura. Era difícil sustentar o olhar dele. Ele falava macio, devagar, e olhava para ela. Como ele a olhava! Já estava até meio tonta quando ele parou o carro no mirante da Niemeyer.

-Nossa, os anos não passam para você! Como você consegue?
- O quê?
- Continuar assim tão linda cinco anos e dois filhos depois...
- Depois do quê? Perguntou, desafiadora.

Ele não respondeu. De um bote, segurou seu rosto entre as mãos e beijou-lhe a boca. Naquele beijo todas as expectativas se dissolveram. Era o que sempre fora. Nunca seriam amigos, nunca seriam indiferentes um ao outro. Ele seria uma pedra de tropeço na sua vida até o fim. Enquanto as línguas se tocavam, os corpos se reconheciam. Seus braços envolveram o corpo dele, a princípio com cuidado, depois com a intensidade de antes. De sempre. Ele devolveu o abraço com vontade. Depois do beijo, os olhos não se deixavam mais.

- Por que, Leo? Por que você fez isso?
- Por quê? Você sabe a resposta, querida...
- E você se esquiva de responder. Como sempre. - Ele passou as mãos na cabeça, exasperado.
- Por que você força essa barra?
- Esquece, Leo. Isso você nunca disse, nem vai dizer. Nunca.

Ele podia ver em seus olhos a decepção. A mesma nuvem escura que escondia o brilho de seus olhos dourados toda vez que estava triste. Por que ele tinha aquele talento para entristecê-la? Ele tinha se prometido nunca mais fazê-lo, mesmo que nunca mais pudesse pôr os olhos nela. Mas não conseguiu cumprir essa promessa. Desde que voltara ao Brasil, só pensava nela. Mulher terrível. Era como criptonita. Todas as defesas dele no chão. Por que ela não entendia que ele não podia se expôr daquele jeito? Ela sempre foi irresistível. E sempre soube disso. Mas precisava escutar. Precisava arrancar aquilo dele. Maldição de mulher!

Ela percebia a frustração dele. Um momento antes os dois tinham estado tão próximos! Como se nunca apartados. E ainda assim, depois de todos aqueles anos de exílio, nenhuma notícia, no postcards, not a hint of memory, e ele queria que ela tivesse deixado de ser ela? Era atrás dela que ele viera, e ela era a mesma. Ontem como hoje. Ninguém muda, de verdade. Só aprende novos truques. Da mesma forma, sua esquiva hoje era como sempre fora. Ele nunca disse. E jamais diria. Maldito homem! Negro como a noite, acendendo aquela fogueira em seu corpo, aquela tormenta na sua alma. Aqueles olhos verdes, aquele mistério, ele a amava. Ela saiba disso. Sempre tivera essa certeza, sempre sentira isso. Mas ele nunca diria. Maldito homem.

- Vamos embora? - Ela perguntou, mas soou como um comando.
- Você vai fazer isso mesmo, Ana? Vai fugir do que aconteceu aqui?
- E o que foi que aconteceu aqui, Leo? Você mais uma vez me ofereceu uma coisa que não pode me dar. E foi. Só que hoje a história é outra, meu caro. Eu sou casada, mãe de duas crianças lindas, tenho uma vida tranqüila, sem sobressaltos. E para que eu ia querer essa distração na minha vida? O que há para mim nessa história?
- Você sabe a resposta, mulher! Como não saberia?
- Simples: você nunca me disse.
- Se é assim, acho que devo jogar fora esse seu maldito telefone! E deu um trabalho enorme para conseguir, você tem noção? - Ela tinha. Nenhuma das amigas comuns daria o telefone a ele assim, fácil, fácil. Devia ter custado muita conversa.
- Ok, dear. Do it. And leave me be - ela virou-se para ir embora. Ele segurou seu braço.
- Volta aqui, querida. Por favor... Você vai embora assim, a gente nem começou...

Ele a puxou para junto. Ela não conseguia respirar. Outro beijo. Outra vez. Ela sabia que não havia como escapar. E o motivo era um só: ela queria tanto quanto ele. Depois de muitos outros beijos, entraram no carro, sem trocar palavra. Ele perguntou:

- Quer que eu te leve para casa?
- Vamos acabar logo com isso, ok? Me leva para o motel.

Ele ficou meio magoado. Não era mesmo só isso que ele queria dela. Nunca fora. E ela insistia em fazer aquilo - sempre. Era como se tudo não passasse de sexo para ela. E se fosse isso mesmo? Maldita mulher.

Entraram naquele motel famoso. Ela não demonstrava nenhuma ansiedade. Por dentro, sentia todos os seus órgãos tremendo. Estacionado o carro, ele saltou para abrir a porta para ela. De repente não sabia se era uma boa idéia. Sentiu-se intimidado. Seu olhar gélido, seu corpo entregue. Como ela conseguia se fechar assim? E por quê?

No quarto, no entanto, outra mulher. A muralha abaixo, acesos os olhos de ouro, os cabelos castanhos, espessos e anelados roçando o rosto dele, seu perfume, seus beijos como se lembrava deles. Ela atacou antes que ele pudesse fazê-lo. Sentou-o na beirada da cama, sentou em seu colo, abriu-lhe a camisa, tocou seu peito enquanto beijava sua boca. Era rastilho de pólvora. Seus beijos incendiários, seu toque entorpecente. Era ela. Ela.

Ela sabia que ele gostaria que ela tomasse a iniciativa. Isso sempre o excitava. Nunca pudera apagar da memória suas preferências, como se o esperasse de volta. De volta para ela. Ela tirou-lhe as roupas, mas deixou que ele a despisse - ele sempre gostou disso, e ela não podia reclamar: ele dava atenção a cada parte desnudada.

- Branca! Sempre tão branca, minha linda! Eu adoro cada parte do teu corpo. - Ele falava as coisas mais lindas enquanto a beijava inteira. Ela quase não tolerava a espera. Mas forçou-se a isso. Precisava aproveitar aquele momento. Ele, ali, agora. O resto não importava.

- O contraste... Eu e você. Parece que eu vou explodir de tanto tesão, Ana.
- O que você está esperando, então? - ela sorriu. Ele desistiu de segurar a onda. Fazer durar uma ova! Fazer de novo, depois. E repetir.

Penetrou seu corpo de uma vez, o pau já doendo de tanto tesão. Era quente, como ele se lembrava. Até mais. E úmida. Tão molhada, ele deslizava dentro dela, tão gostoso... Sabia que precisava parar, ou ela ficaria na vontade. Ela nunca tinha ligado para isso. Era uma questão de poder, ele sabia, fazer um homem perder o controle. Mas não faria isso com ele hoje. Ele saiu de dentro dela. Ela ainda tentou agarrá-lo, as pernas entrelaçadas em suas costas. Ele desvencilhou-se e desceu por seu corpo até estar de frente para o crime. Olhou para ela. Estava tensa, na expectativa. Ele nunca decepcionava. Sua boca cobriu-lhe o sexo com fome. Sua língua, seus lábios. "Cara, você sabe fazer isso!" Lentamente, suavemente, até que ela explodisse. E ele não tinha pressa. O gosto dela, tão apetitosa! Que mulher deliciosa! Podia comer-lhe a boceta o dia inteiro, se fartar daquela fruta suculenta, lambuzar a cara toda, sentir seu cheiro... ele ia gozar enquanto a lambia. Não podia mais segurar. Ela gozou. Ele gozou. Beijaram-se.

- Meu Deus, isso é incrível! - ela disse, sem fôlego. Então, ele a olhou nos olhos. "Danem-se as defesas!"
- Ai, Ana... Como eu te amo. Eu sempre te amei, minha linda.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Erótica

Encontraram-se um posto de gasolina próximo a casa dele. "Queria te levar para conhecer a minha casa"- foi o que lhe disse. Balela. Os dois sabiam que essa era a isca de pescar sereia. E ela se deixaria capturar, só pelo gozo.

Entrou em seu carro. "Você está linda hoje." Um beijo no rosto, a eletricidade no ar. "Você é muito galante, obrigada." Os poucos quilômetros entre o ponto de encontro e a casa dele arrastavam-se. As mãos dele no volante, poucas palavras trocadas - todas inúteis e estúpidas. O que se dizer quando o que se quer está tão claro?

Ele virou a direita no final da rua. "Chegamos." Abriu o portão da garagem com o controle remoto. Tentavam não se olhar diretamente, mas a tensão era insustentável. Portão fechado, nenhum segundo a perder. Ele a atacou imediatamente. Com sua boca ávida cobriu a dela, e violento, enfiou a língua por entre seus lábios. Com os dedos entre seus cabelos, puxou sua cabeça para trás. Ela gemeu alto, descontrolada. Ele lambeu seu pescoço e seu colo.

Ela passou sua perna direita por cima dele, acionando a buzina nessa manobra. Riram, os dois. Ela sentou-se sobre o pau dele enquanto desabotoava a blusa de cetim. Ele levantou sua saia e segurou com força seu quadril, enterrando as unhas nela. "Ai, assim eu vou ficar marcada..." Aquele sorriso de puta acabava com ele. Enfiou a cara entre seus peitos, lambeu seus mamilos ao mesmo tempo em que procurava espaço entre a pele e a calcinha.

Ela desabotou-lhe a calça, abriu o zíper e puxou para fora seu pau, tão duro que ela pensou que a roupa já devia estar machucando... "Você me come? Por favor!" Ele não precisava ouví-la pedir duas vezes. Seus dedos a penetraram sob a calcinha, colhendo o néctar da sua excitação. Ela semicerrou os olhos ao toque másculo, forte, desses dedos. A calcinha apartada, ele penetrou sua boceta com virilidade, enquanto lambia os dedos e lhe dizia, meio enlouquecido de tanto tesão, que seu gosto, seu cheiro, seu toque... "Tudo em você é lindo, minha menina bonita. Eu quero você muito mais que aqui, assim, desse jeito sem jeito."

"Essa tarde eu sou sua, meu caro." Ela sorriu. Sentia que ia gozar rapidamente, e então intensificou o ritmo da cavalgada. Ele adorava estar naquela posição, vê-la controlar seu gozo - sem imaginar como era difícil para ele se controlar..."Estou louca, querido, vou morrer, vou sumir, mas vou gozar agora!" Ele tirou as mãos de seus quadris e acariciou suas costas. Com um espasmo, ela gozou sem gritar, mas ele sentiu que junto com sua porra escorria também o sumo daquela fruta.

Sem palavras, beijaram-se e olharam nos olhos um do outro. Tanto desejo, tão fácil, descomplicado. "É por isso que dura"- ele pensou. Quase três anos. Essa mulher...

"Ele pode me levar a loucura. Mas é isso." Tanto desejo, tão simples, tanta cumplicidade. "É por isso que estamos nisso a tanto tempo..." - ela pensou. Três anos. Por que logo esse homem? Ai, esse homem...

"Vem comigo, mocinha"- ele disse, depois de recompostos. "Quero te mostrar o resto da casa". Ela sorriu. Imaginou o que lhe reservava a tarde. E ele pensou na imagem dela, espalhada pela casa, em todos os cômodos. Seus sorrisos, sua pele, seus olhos, o gosto da carne macia... "Como vou me mudar com a família para cá, depois disso?"

As regras do rolê

As regras do rolê são bastantes simples: Fode, mas não se apaixona. Se apaixonar, não fode mais, pra não se foder depois. Tudo o que te ...