sábado, 25 de junho de 2011

Cotidiano

Levantou-se resoluta. Bateu os pés no chão frio e despertou completamente. Abriu as cortinas para deixar a luz do Sol entrar no quarto diminuto daquele hotel barato onde estava morando. Não havia muito para olhar naquele lugar. Correu para o banheiro quando sentiu a urgência do chamado da natureza. Abriu o chuveiro e molhou-se rapidamente. Fechou o chuveiro. Ensaboou-se. Enxaguou-se. Enxugou-se. Vestiu-se. Saiu.

Tudo tão automático, tão simples, tão banal. Era como ela via sua vida inteira. Talvez por isso fosse tão displicente. Todas as atividades de seu dia, repetidas à exaustão, como um mantra às avessas, que não lhe trazia nem paz, nem revelação. Mesmo assim era uma benção não ter que pensar para nada. A mente vazia de reflexões, preocupações, dúvidas ou dilemas. Ah, a benção do esquecimento...

Encostou no balcão da padaria e pediu o de sempre. Comeu seu pão na chapa, bebeu a média quente um pouco rápido demais e queimou a língua. Mais um motivo para manter o silêncio. Entrou no ônibus lotado e encolheu-se num cantinho. Deslizou para um cochilo quase instantâneo. Acordou quando chegou no ponto final.

Trinta e cinco camisas sociais, dezoito calças, cinco vestidos de festa. Destes não gostava, absolutamente - e por isso começou por eles. Cuidadosa, atenta aos detalhes, esticava com vapor cada pequena dobra do tecido fino, preservando cada miçanga, cada paetê, cada bordado. Quando sua mente começava a se encher de devaneios, como quem teria usado aquele vestido, ou o que tinha acontecido quando foi usado, ela se concentrava e contava as miçangas. E a mente ficava vazia, e ela voltava a seu estado de perfeita alienação.

Adorava roupas masculinas, e as achava simples e sem imaginação. Por mais de três vezes havia pedido ao supervisor que lhe desse somente roupas de homem. Ah, os ternos, as camisas, os coletes! Todos diferentes, e completamente iguais. Seria mais fácil trabalhar sem que os devaneios invadissem sua mente e a povoassem com idéias de uma vida outra, fora de seu alcance, se não houvesse em sua estação de trabalho vestidos como aqueles para passar.

Ao fim do dia, ônibus lotado novamente, a necessidade de resistir ao sono para não perder o ponto, ela fazia palavras cruzadas. "Aquele que fala muito"com nove letras... Eloquente! "Washington Luís, presidente" - WL. "Mentir, em inglês" - Lie. Desceu do ônibus em frente à padaria, pediu um pedaço de empadão de frango e uma coca-cola e subiu a rua, de volta para onde seu dia começara. Abriu a porta do quarto, depois de achar as chaves dentro da bolsa - não sem alguma dificuldade. Entrou e deixou a comida sobre a mesinha sob a janela. Colocou a coca-cola dentro do frigobar. Largou-se na cama e ligou a TV. Gostava de assistir novelas sem ouvir os diálogos, e era como se a sucessão de imagens tivesse um efeito hipnótico sobre ela. As pálpebras pesavam, e ela mergulhava num sono profundo - para acordar somente no dia seguinte.

Não se lembrava de um dia diferente. Nem queria lembrar. Havia encontrado a paz. E aquilo a que chamam de felicidade...


As regras do rolê

As regras do rolê são bastantes simples: Fode, mas não se apaixona. Se apaixonar, não fode mais, pra não se foder depois. Tudo o que te ...