segunda-feira, 21 de junho de 2010

Meteorologia

Os eventos atmosféricos não lhe interessavam. Para ele, a verdade residia no que está para além da última fronteira terrestre: no espaço sideral, entre os planetas e estrelas distantes. Nunca se importava com a previsão meteorológica. Por vezes era surpreendido por um temporal, ventos, frentes frias. Mas não se abalava: isso era tudo bobagem da troposfera! E de que adiantava ela dar-se ao trabalho de cobrir-se de nuvens, movimentar o ar que a compunha, descarregar suas diferenças de potencial eletrostático sobre os oceanos e continentes? Ele sabia – ela também – que acima das nuvens os céus são azuis, e o espalhamento da luz Solar por dentro dela era o verdadeiro responsável pelo espetáculo colorido de todo dia. Sim, nem o próprio azul que lhe é característico não lhe pertence – e a atmosfera o sabe. As cores do poente, o desfile de violetas e alaranjados, o arco-íris, até mesmo a aurora boreal: tudo isso é um artifício físico, a fragmentação prismática da luz.

A luz do Sol – essa constante – ilumina a Terra todo o tempo. Mesmo enquanto é noite em um continente, sempre é dia em outro ponto diametralmente oposto do Globo. Mesmo quando as nuvens teimam em encobrir sua luz em pleno dia, ainda assim é dia – mesmo quando o dia anoitece na hora do Sol a pino.

Mesmo naquela quarta-feira de janeiro, quando a tempestade desabou sobre a cidade de uma vez, e alagou as ruas entre seu trabalho e sua casa, e ele precisou ligar para avisar a mãe que dormiria no observatório. Mesmo que a companhia dela tivesse sido perfeita naquela noite de verão. Mesmo que tivessem passado metade da noite em claro – sussurrando confidências e inconfidências, rindo alto, fazendo amor por longas horas. Mesmo assim, acima das nuvens – ele sabia, ela nem desconfiava – o Sol ainda lançava sobre a Terra sua luz radioativa. Mesmo que depois daquela noite em claro nunca mais tivessem dormido juntos – ou virado outra noite acordados, nos braços um do outro.

Dito isso, que poderia importar a meteorologia?

Esse segredo da astrofísica ficaria bem guardado, enquanto ele vivesse: que ela é uma estrela, que hoje ela brilha forte nos braços de um homem que soube tomá-la para si, e que em noites de inundação é melhor ficar onde se está, e olhar além do corriqueiro, do cotidiano. Olhar além das nuvens – dentro do coração das galáxias. E lembrar que nada disso importa.


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